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Artigo

INESC Porto a seus pés

“Dinâmicas de Inovação do Setor Português do Calçado” é o título do estudo que a Associação Portuguesa dos Industriais de Calçado, Componentes, Artigos de Pele e seus Sucedâneos (APICCAPS) encomendou ao INESC Porto e onde se concluiu que a inovação é um eixo estratégico da indústria do calçado que, face às necessidades do mercado, conseguiu reinventar-se, tornando-se menos tradicional e mais inovadora. Este caráter diferenciador que a indústria do calçado tem vindo a consolidar ao longo dos anos contou com o apoio do INESC Porto. O BIP revisita agora alguns dos projetos com cunho do INESC Porto que colocaram o Portugal no mapa da elite mundial do calçado.

17 maio 2011

Setor do calçado mais competitivo e inovador com apoio do INESC Porto

A inovação como caráter diferenciador

A partir da década de 90, com a pressão competitiva exercida pelos mercados asiáticos emergentes, classificados por uma mão de obra mais barata, o prenúncio da dispersão de empresas estrangeiras com unidades produtivas em Portugal para países com menores custos de produção, e as alterações drásticas nos padrões de consumo conduziram ao esgotamento de um posicionamento tradicional altamente focalizado na etapa de produção.

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Perante este cenário que parecia desolador para o setor em Portugal, as empresas portuguesas na área do calçado assumiram os desafios da “diferenciação e valorização do produto” e consolidação da aposta na “via tecnológica”, revela o estudo levado a cabo pela Unidade de Inovação e Transferência de Tecnologia (UITT) do INESC Porto.

Reforçando a sua base produtiva, a indústria foi capaz de se adaptar às novas exigências do mercado, investindo sempre numa estreita cooperação entre parceiros de I&D. Assim, as empresas de calçado passaram de uma cultura de produção para uma cultura de design e marketing. E é aqui que reside a sua diferenciação. Com isto, o calçado português aposta numa produção flexível e com resposta rápida, por oposição a modelos de produção em larga escala. Ao conseguir adaptar-se, e assim reinventar-se, a indústria portuguesa do calçado assume-se como inovadora.

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Respostas às exigências do mercado

Em parceria com Centro Tecnológico do Calçado Português (CTCP) e fornecedores de tecnologia, o INESC Porto, mais particularmente através da sua Unidade de Engenharia de Sistemas de Produção (UESP), tem vindo a desenvolver, nas últimas duas décadas, métodos de organização, sistemas informáticos e equipamentos que melhor se adaptam às necessidades do setor. Mais rapidez, resposta a pequenas séries e investimento em marcas próprias eram os objetivos.

A estratégia de colaboração entre empresas utilizadoras e desenvolvedoras de tecnologia levou à criação de equipamentos e soluções que permitiram implementar estratégias que diferenciaram as empresas portuguesas do setor das estrangeiras: “Portugal é mesmo o único país europeu que exporta mais sapatos do que importa”, afirma Luís Carneiro, coordenador da UESP, tendo o trabalho de Investigação e Desenvolvimento (I&D) do INESC Porto contribuído para esta determinante capacidade competitiva.

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As pressões para a diminuição drástica da dimensão média das encomendas, a diversidade e sofisticação dos modelos e a diminuição dos prazos de entrega verificadas em vários setores industriais tornam inviável a utilização das ferramentas tradicionais de planeamento e controlo de linhas de produção, provocando um descontrolo do processo e consequente perda de produtividade. Ambos projetos nacionais, o SABE (Sistema de Apoio ao Balanceamento/Escalonamento da produção), com início em 2001, e o SIBAP (Sistema Automático de Balanceamento de Linhas de Produção), iniciado em 2010, vieram colmatar estas lacunas disponibilizando ferramentas de apoio ao balanceamento e escalonamento de linhas de produção, o que levou a um considerável aumento de produtividade através da criação de um equilíbrio eficaz entre todas as operações que se executam na linha de produção.

Produção mais rápida e flexível

Com o trabalho dos seus investigadores, o INESC Porto contribuiu para elevar o nível de flexibilidade da produção de calçado, permitindo um fabrico mais rápido e com um menor esforço de conceção. Exemplo disso é o projeto SIMULOG (Simulação e operação de sistemas de Logística interna), que teve início em 2007. Trata-se de um projeto na área de logística e simulação que permite às empresas produtoras de equipamentos identificar antecipadamente possíveis problemas e reduzir significativamente os tempos e custos de desenvolvimento e teste nas instalações das empresas clientes, aumentando desta forma a sua competitividade. Com os modelos de simulação desenvolvidos é possível testar o software de controlo mesmo antes de o sistema físico ser instalado na empresa cliente, reduzindo significativamente o custo de desenvolvimento, melhorando a qualidade e reduzindo as quebras de produção durante a fase de instalação.

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Outro exemplo de sucesso é o software Agilplan, que teve início em 2009, e que consiste num sistema de planeamento de produção de empresas de calçado. Trata-se de um sistema mais ágil que permite planear a produção em ambientes de incerteza, diferindo assim dos sistemas mais tradicionais. Concebido para as pequenas e médias empresas (PME) produtoras de calçado e de componentes da fileira do calçado, este sistema permite um desenvolvimento ágil de planos em cenários de produção por encomenda e num ambiente em que o grau de incerteza e a escassez de informação abundam, dificultando assim a tarefa das empresas no desenvolvimento de planos coerentes e atualizados.

A variedade de modelos, de materiais e o crescimento das pequenas encomendas por modelo geram crescentes dificuldades de organização, gestão e planeamento. Esta ferramenta, desenhada e desenvolvida em parceria com a empresa Oficina de Soluções, vem assim dar resposta a essas necessidades identificadas pelas empresas. Em termos genéricos, o sistema Agilplan adota uma interface "user friendly" de muito simples interação com o utilizador, recorrendo a técnicas "drag and drop" (arrastar e soltar) e de software para ajuste e replaneamento automático dos planos de produção, sempre que a situação e as novas informações assim o exijam. A comprovar este sucesso está o facto de o sistema ter sido premiado na categoria de “Software” dos “Prémios Inovação na Fileira do Calçado” em 2010.

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Uma aposta ganha

A solução ShoeID foi desenvolvida para a empresa FLY London com o objetivo de melhorar a eficiência em toda a cadeia de abastecimento. Além de otimizar os processos e ajudar a evitar perdas na cadeia logística, a solução agrega valor na loja. E como é que isso se processa? A inovação está na incorporação de um piso inteligente RFID (Radio-Frequency IDentification) que permite ao cliente experimentar um par de sapatos e ver a sua imagem projetada, em tempo real, num ecrã que o coloca de imediato num cenário interativo e virtual das movimentadas ruas de Londres, Nova Iorque ou Tóquio. Esta inovação foi a chave para a conquista do RETA Europe Awards, um prémio que trouxe bastante visibilidade e relevância para o projeto, e consequentemente para o INESC Porto.

O primeiro projeto europeu na área do calçado em que o INESC Porto participou foi o EUROShoe (software de automação em logística interna entre secções, 2003) e constituiu uma primeira experiência dos Projetos Integrados (PI) que a UE veio lançar mais tarde. Aqui, o INESC Porto desenvolveu uma importante rede de contactos. Mas foi o CEC-made-shoe (Custom, Environment and Comfort made shoe) que trouxe todo um novo nível de visibilidade para o setor. O INESC Porto participou em três sub-projetos: o PICShoe (sistema de integração e coordenação da cadeia de fornecimento com base em tecnologia workflow), Pervasive Quality Control (controlo de qualidade de produto de forma automática e em tempo real) e One-step Production Process (novo sistema de produção especialmente vocacionado para a produção de pequenas séries de calçado costumizado), tendo coordenado a WorkPackage relacionada com os Sistemas de Informação.

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O sistema One-Step constituiu um dos resultados mais significativos do projeto CEC-made-shoe, com impacto relevante na indústria. Trata-se de um projeto inovador por colocar as várias operações numa única sequência linear, ou seja, o calçado é produzido numa única etapa (corte, costura, montagem e acabamento). O One-Step é mesmo o consolidar de uma posição internacional das competências da UESP/INESC Porto de um trabalho que se iniciou com o EUROShoe. Apostando na produção de pequenas séries, evita-se a necessidade de stocks elevados, tendo o ganho de  produtividade sido superior a 15 por cento em ambientes de produção de pequenas séries. É possível produzir lotes de produção mais pequenos, aumentando a capacidade de produção, a flexibilidade e reduzindo os prazos de entrega. O CEC-made-shoe afirma-se assim como um marco para a competitividade europeia ao introduzir melhorias radicais no processo de produção e ainda a conceção de novos produtos: aqui abriu-se caminho para o calçado biodegradável, calçado inteligente (com capacidade para se adaptar às condições do ambiente) e calçado sem costuras.

O utilizador no centro da estratégia

A aposta em marcas próprias e a produção de calçado costumizado são fatores chave para o sucesso atual do calçado português e europeu. E o que nos reserva o futuro? A resposta é o desenvolvimento e fabrico de produtos que respondem às necessidades específicas dos seus utilizadores. Exemplos disso são os projetos Europeus Fit4U (Framework of Integrated Technologies for User Centered Products), que arrancou em 2009, e o CORENET (Customer-oriented and eco-friendly networks for healthy fashionable goods), com início em 2010, ambos com a participação do INESC Porto. Mais concretamente, o CORENET tem como objetivo fornecer peças de vestuário e calçado funcionais e de alta qualidade, a preços aceitáveis e com compatibilidade ecológica, contemplando as necessidades de um grande número de cidadãos europeus, assim como de grupos específicos, tais como os idosos e pessoas que sofrem de obesidade ou diabetes. Desenvolvido com a parceria da Tomorrow Options, empresa spin-off do INESC Porto, este projeto europeu considera nichos sociais relevantes, oferecendo-lhes artigos “saudáveis” e personalizados.

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E é este o futuro – as necessidades do utilizador no centro da estratégia. Perspetiva-se para breve um novo Projeto Mobilizador do Calçado intitulado NEWALK – Materiais, Componentes e Tecnologias para Calçado do Futuro, que visa o desenvolvimento integrado e sinérgico de novos materiais, componentes funcionais e tecnologias avançadas para a criação, produção e comercialização de calçado diferenciado. Neste projeto o INESC Porto, em parceria com a empresa Flowmat, irá conceber abordagens e sistemas para melhorar os processos de receção de materiais e sua entrada em produção, em ambientes de produção de pequenas séries.

Resposta às necessidades do mercado, mais flexibilidade, intervenção nas diversas fases do fabrico de calçado e ligação entre elas, maior rapidez de produção, calçado diferenciado e costumizado: todos estes são aspetos para os quais o INESC Porto tem vindo a contribuir há quase duas décadas e que trouxeram vantagens competitivas extraordinárias para o calçado português. De acordo com Luís Carneiro, “o calçado português conseguiu alcançar maior valor acrescentado e preços mais elevados no mercado por apostar em segmentos de mercado onde a moda, a resposta rápida, a qualidade e a marca são requisitos essenciais”. Assim, produzindo em pequenas quantidades, sem nunca descurar o fator moda, conseguem-se margens elevadas. Com a participação em todos os projetos referidos e muitos outros referidos em números anteriores do BIP, o INESC Porto contribuiu para levar o calçado português a um nível de excelência destacado, sendo o calçado português, em média, já o segundo mais caro do mundo, logo a seguir ao italiano.

Fonte: BIP 115